ESCOLA E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: De que falamos, afinal?

Para que se efetive a noção de escola inclusiva é necessário que esta não fique pelo nível das ideias, e para que tal não aconteça o sistema educativo não pode continuar a privilegiar a visão de currículo como sendo o programa e a impor o cumprimento do manual ao longo do ano letivo. Se isso continuar a acontecer, as necessidades educativas de um alargado número de alunos não terão respostas e as necessidades educativas especiais de alguns dos alunos irão acentuar-se.

O currículo deve ser concebido de acordo com as necessidades e as caraterísticas de cada aluno, pois só assim se terá alguma resposta curricular fundamentada, apropriada e individualizada às caraterísticas e às necessidades dos alunos.

Para que se cumpra o conceito de escola inclusiva, esta não se pode limitar a ser uma escola que recebe todos os alunos. Para ser inclusiva o propósito e a finalidade da escola têm de ser realizados de forma plena, isto é, todos os alunos têm de aprender. Deste modo, para que os alunos com necessidades educativas especiais se sintam integrados num ambiente escolar regular, será necessário realizar, por parte da instituição escolar, ajustamentos e as adaptações curriculares apropriadas.

Entende-se como adaptações curriculares as alterações ou os suplementos que são necessários realizar para a maximização do potencial do aluno, para além de potencializar as suas aprendizagens. Assim, as adaptações curriculares, segundo Correia (2013) poderão ser feitas ao nível dos tópicos, dos conteúdos e das sequências a serem lecionadas. Segundo este autor, a escola não deve limitar os ajustamentos e as adaptações realizadas à planificação das unidades a serem lecionadas, ou seja, aos objetivos, conteúdos, estratégias/materiais e avaliação, deverão também abranger um conjunto de técnicas de ensino tais como: a cooperação e a colaboração e as tecnologias de informação e comunicação.

Sem dúvida que as adaptações e ajustamentos curriculares exigem do professor que os aplica, não só uma especial capacidade de flexibilização, como também uma cuidada atenção no que respeita aos conteúdos a lecionar e a forma como eles são apresentados, uma vez que os alunos com necessidades educativas especiais apresentam algumas dificuldades ao nível da morosidade que levam a aprender e a executar qualquer atividade. A seleção rigorosa dos conteúdos a lecionar é muito relevante, pois evita perda de tempo com aquisições desnecessárias para o aluno. Neste processo é preciso não descuidar os transtornos de memórias quase sempre a associados a alunos com necessidades educativas especiais, que os levam muitas vezes a esquecer rapidamente o que aprendem, assim torna-se decisivo que se pratique com bastante regularidade aquilo que foi ensinado. Para além de tudo disso, o professor terá que ter em conta a dificuldade de estes alunos realizarem operações de generalização e transferência, o que exige, sempre que possível, a recorrerem a espaços e situações reais de aprendizagem de forma a porem em prática as suas aprendizagens. Outro aspeto importante que requer atenção do professor aquando das adaptações curriculares é o facto de alguns alunos com NEE apresentarem dificuldades ao nível da aquisição de conceitos abstratos, logo é importante que os conteúdos curriculares sejam significativos e materializados.

Requerem-se, assim, práticas de ensino funcionais que fomentem uma efetiva aprendizagem dos alunos com NEE. Por esse motivo se confirma que para que essas aprendizagens sejam eficazes e úteis poderá ser imperioso recorrer-se a ajustamentos e adaptações curriculares de modo a otimizar os ambientes de aprendizagem. Apenas assim, através de uma planificação cuidada e de uma intervenção individualizada e apropriada a cada aluno, se poderá dar respostas efetivas às carências dos alunos com NEE.

De acordo com Correia (2013): “Conhecer as capacidades e necessidades de um aluno, bem como as caraterísticas dos ambientes em que ele se move, deve ser o primeiro passo de um leque de procedimentos que visam promover sucesso educativo […]” (p.140), isto é, as estratégias de ensino, quando ajustadas às caraterísticas e às necessidades dos alunos, conduzem ao sucesso da inclusão e, na medida do possível, ao sucesso escolar e a uma participação ativa destes alunos na sociedade em que estão inseridos.

Efetivamente, para que isso aconteça, urge que as escolas estejam equipadas com recursos, meios didáticos e materiais que facilitem o atendimento a estes alunos, e que os professores, auxiliares, técnicos e organização escolar trabalhem em equipa, realizando os ajustamentos e adaptações curriculares necessárias para darem respostas educativas eficazes a estes alunos. Cada escola deve realizar as necessárias modificações e adaptações curriculares, em função das caraterísticas, necessidades, condições e possibilidades de cada aluno. Segundo Correia (2013) as escolas devem proceder a diferentes níveis de concretização das adaptações curriculares, que se traduz no seguinte:

  • Adaptações de primeiro nível ou de contextualização: isto traduz-se por uma análise das realidades e das necessidades locais dos alunos que frequentam determinada escola/agrupamento, de forma a responder, eficazmente, às necessidades de todos os alunos que nela se insiram, nomeadamente os alunos com necessidades educativas especiais.
  • Adaptações de segundo nível ou ao nível da turma: significa que é necessário realizar uma análise profunda das necessidades, das caraterísticas socioeconómicas e culturais, o grau de motivação dos alunos, as suas expectativas, os seus interesses particulares e a presença de alunos com NEE na turma, de maneira a estabelecer metas, normas e exigências segundo as características de cada turma. A planificação deveria ser elaborada em função da turma, segundo o seu perfil, com os professores da mesma, para analisarem as implicações curriculares daí decorrentes, quer em termos de organização do processo de ensino-aprendizagem, quer em termos da organização social da turma ou em termos de organização do espaço e distribuição dos alunos.
  • Adaptações de terceiro nível ou ao nível do aluno: quer isto dizer que é necessário considerar cada aluno individualmente em termos de necessidades educativas, ou seja, deve ter-se em consideração os traços de personalidade (autoestima, autonomia, capacidade de adaptação, resistência à fadiga, o tempo de atenção, o relacionamento com os colegas e adultos (professores, auxiliares de educação, serviços de apoio), as expectativas e as suas frustrações). Todos estes elementos são fundamentais para que se elabore um apoio especializado, com recursos específicos às situações educativas especificas.

Como já referimos anteriormente, o currículo não se pode confundir com programa, e muito menos devem ser estáticos e inalteráveis. Eles têm de ser entendidos como algo dinâmico e devem fazer-se acompanhar de informações detalhadas sobre aspetos que dissessem respeito às caraterísticas e necessidades de cada aluno, pois assim cada professor poderia compreender o funcionamento académico, emocional e social do aluno e assim adaptar de forma eficaz as estratégias de ensino para que todos, efetivamente, aprendessem.

Para concluir, a prioridade do ensino tem de ser a aquisição de competências por parte de todos os alunos. Contudo, não deve ser obrigatório que todos atinjam o mesmo grau de conhecimentos e muito menos ao mesmo tempo. Por isso, o esquema curricular deverá ser aberto e flexível para se poder adaptar às diferentes necessidades dos alunos, dando prioridade a determinados objetivos ou conteúdos, na eliminação e/ou introdução de alguns conteúdos e até mesmo na temporização, com trocas no tempo previsto para alcançar determinados objetivos.

 

Dra. Ana Isabel Lopes
Ensino Especial e Apoio Psicopedagógico| HEURÍSTICA – Centro de Psicologia e Educação